(17:27 h)
e pensar que tudo
pode ser
pura imaginação
a dor
nas têmporas
o tempo
que anoitece
e o próprio abismo
nem sei por que insisto
em voltar à infância
ao bom menino
magro
um pouco gago
um tanto aparvalhado
escalando as paredes
que separavam
o quintal
do jardim interno
um bom menino
escalando a infância
subindo pelas paredes
até o telhado
manchando a branquidão
dos muros
enquanto
minha mãe reclamava
ainda ouço
sua voz
mãe
mais jovem
da que ouço agora
e reclamava
das manchas
das minhas patas
como dizia
você
meu pai
ainda ouço
sua voz
tão nítida
como eram nítidas
as manchas
nas paredes
naquele tempo
como ouço
agora
sua voz
flutuando
sobre
o abismo
e pensar
que ainda assim insisto
em voltar ao bom menino
que desejava
ser pássaro
é o que eu lembro
ao mesmo tempo
em que procuro
no mais profundo
escuro
a saída
deste campo santo
deste abismo sagrado
até que me descubro
em frente
ao portão trancado