(16:23 h)

mesmo que permaneça
eternamente
na caderneta
esse esboço
de um novo homem
tão comum
devo dizer
que ele enxerga
novas arestas
em tudo

ele me diz
          ou eu mesmo
          imagino
que todas as coisas
trazem dentro delas
outras coisas
completamente
imperceptíveis
          ele diz que
          um peixe na areia
          guarda dois diamantes
          nos olhos

          e que
          certas infâncias
          trazem o universo
          para mais perto

          e que
          um camundongo
          dentro de uma caixa miúda
          é um falcão dourado

          e que
          o olhar do símio
          atrás das grades
          é o meu próprio olhar

          e que
          os sete estágios da dor
          convivem
          num mesmo estágio

          e que
          o útero de todas as mães
          é o cálice
          da eternidade

          e diz também que
          o mapa das ruas
          da minha cidade
          mora na palma da minha mão
é sobre este homem que escrevo
a caderneta
no peito
colada
ao peito

e assim percorro a cidade
olhando para minhas mãos
e o sol
e sua dor
de sol
me acaricia
e me atravessa
já não tenho certeza
se sou
um esboço
um personagem
um novo homem
um homem velho
mas sei que estou
a caminho do cemitério
à procura
da lápide
de meu pai